22 de jan. de 2011

Cânticos de Morte VI (Normannorum)

(Este texto é do livro "Normannorum" que escrevi sobre os Vikings. Este trecho narra a cerimônia de despedida de uma princesa do povo Dano morta em batalha.)



A manhã estava cinza, sombria. O ar exalava um odor de enxofre. O céu estava escuro. Podia ouvir o vento gélido surrando as árvores. Era cortante como a dor que eu estava sentindo. Faltava-me ar. O coração apertado. Odin tirara de mim o bem mais precioso do mundo. Queria se vingar por eu nunca ter desejado ser um guerreiro. Restara minha Svava. Levamos o corpo de minha amada ao alto da colina. Depositamo-lo sobre uma cama de palhas e madeiras. Voltaria para o Valhöll com as honras merecidas. Suas cinzas seriam espalhadas por Essex. Mostraríamos a todos quem destruíra Ignar. Seu nome seria cantando por poetas. Sua glória seria contada de boca em boca. Seus amigos carregavam-na sobre uma peça de madeira toda ornada de flores silvestres. Estava linda. Parecia estar dormindo. Depositaram-na sobre as palhas. Pude ouvir quando Helena e Edwirges, em baixo tom, declamaram o poema para seu Deus. As mãos de Cristiane estavam frias. Não pude evitar. Chorei. Debrucei-me sobre seu corpo. Queria trocar de lugar com ela. O pobre Baltic não acreditava que sua única filha estava ali, deixando-o para sempre. Svava não conseguia entender o que acontecera. Thoran a confortava, se é que isso era possível. Gutis trazia consigo a espada que a feriu mortalmente, e seu anel de casamento. Depositou-os ao seu lado. Gutis jogou algumas essências sobre seu corpo e começou a dizer algumas palavras em língua estranha. Eu vi quando atrás de Gutis surgiu o vulto da Filgia. Seu olhar baixo. Estava em silêncio. Parecia entender o que Gutis dizia. Gutis se silencia e ateia fogo nas palhas. Filgia ergue seus braços. Está com um longo vestido branco. O céu escurece ainda mais. O fogo se alastra e encobre o corpo de Cristiane. Filgia abaixa os braços e estende as mãos. Começo a tremer. Cristiane levanta-se da fogueira e caminha até Filgia. Quero chamá-la, mas meu corpo está imóvel e minha voz não se faz ouvida. Apenas a vejo voltar seu olhar para mim. Sorri. Parece despedir-se. Caio de joelhos em terra. Meu corpo está pesado, sou acolhido por Svava. Queria entender o que ela dizia, mas ouvia cada vez mais longe. Vi quando Filgia se aproximou de mim.



- Não podes culpar-se. Estava escrito. Ao tirar a vida de Ignar você fez sua escolha. - Disse-me.


- Não fosse por mim estaria viva. - Conclui nervosamente.


- Os caminhos são vários. Você escolheu o seu. Cristiane apenas o fez enxergá-lo. Ela era dona desta missão. Se quiseres culpar alguém, culpe Rutland. Ele colocou Ignar em seu caminho. - Disse querendo inserir mais ódio em meu coração.


- O anel. Por que não a ajudou?


- O anel não contém poderes. A espada contém. Helena a possui e só você pode despertar o poder da espada. Mas se tiveres dúvidas não a use. O mal está cravado em seu punho.


- Deixe despedir-me dela. - Apontei para Cristiane.


- A matéria se foi consumada. Aqui não há despedidas.


Filgia se vai a brancas nuvens. Eu pareço pairar no ar. Meu pulmão se esforça para manter-me vivo. Fico deitado.



Nenhum comentário:

Postar um comentário